Saúde mental: universitários revelam problemas psicológicos
por Jaqueline Damaceno e Vanessa Forte
As exigências no ambiente universitário contribuem para o agravo na saúde mental dos estudantes. 30% desenvolvem problemas mentais no ensino superior, segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES). As cargas das atividades de ensino e extracurriculares, aliadas às demandas da vida social e adulta, pois muitos precisam trabalhar enquanto estudam, estão entre as dificuldades relatadas pelos universitários. Essas situações podem gerar desorientação, ansiedade, estresse, tristeza, desânimo, insônia e depressão.
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A euforia sentida por Daniele Mesquita, de 22 anos, ao entrar na universidade se transformou em tristeza já no primeiro semestre. As atividades acumularam e o que parecia um sonho se transformou em pesadelo. No meio do caminho, teve uma crise nervosa, a ponto de não participar das aulas e das atividades acadêmicas que tanto desejava.
Ao encarar a pressão por boas notas, a carga horária exaustiva e a dificuldade financeira, Lívia Nunes, de 20 anos, começou a ter crises de ansiedade no primeiro período de graduação do curso de Letras da UNIR. Ao entrar na universidade, viu sua rotina pessoal ser totalmente transformada devido ao estudo. “Antes da faculdade, eu me dedicava muito à música, agora deu uma travada e eu tive que parar”, explicou. A estudante já tinha algumas instabilidades antes de entrar na universidade, mas os sintomas se tornaram uma ansiedade diagnosticada.

Lívia e Daniele fazem parte do número cada vez mais expressivo de estudantes que passam por algum tipo de sofrimento psíquico durante o período universitário. 30% dos estudantes desenvolveram problemas mentais no ensino superior no ano de 2016. Desses alunos, 10% disseram fazer o uso de algum medicamento psiquiátrico, segundo a ANDIFES.
Essa porcentagem tem aumentado cada vez mais, preocupando profissionais da área e educadores. O Brasil ocupa o segundo lugar no ranking de 180 países pesquisados, no quesito ansiedade. Com 58,36%, a ansiedade é a principal dificuldade emocional relatada pelos estudantes de graduação, de acordo com o Programa de Avaliação Internacional de Estudantes da Organização para Cooperação Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A psicóloga Daniele Naconechny explicou que os jovens estão mais vulneráveis a desenvolver distúrbios emocionais, devido à falta de experiência social. Muitos adolescentes foram muito protegidos pelos pais e, ao entrarem na universidade, são tratados como adultos que precisam ter as suas próprias decisões. “Alguns estudantes entram na universidade muito cedo e não estão preparados para a responsabilidade que o mundo acadêmico exige”, afirmou.
Para a acadêmica de Jornalismo da UNIR, Vitória Rogério, de 20 anos, os problemas emocionais são decorrentes da pressão acadêmica e familiar. Ela revela que a escolha do curso foi difícil, pois os seus pais não concordaram de início. Vitória tenta se dedicar ao máximo para não os decepcioná-los. “Para os meus pais, eu preciso ser perfeita e nem sempre sou assim”, relevou.
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Vitória disse ainda que o esgotamento físico prejudicou o seu rendimento acadêmico, ao conciliar os estudos com o trabalho de apresentadora e de modelo, além de outras atividades extras que faz, para complementar a sua renda. Sozinha durante os primeiros semestres, faltou inúmeras vezes ao curso por não conseguir levantar da cama, ocasionando também na recusa de propostas de trabalho. “Eu me sentia esgotada o tempo todo, e toda a pressão que eu recebia, seja dos meus pais, do trabalho e da faculdade, foi acumulando e chegou uma hora que eu não aguentava mais”, contou.
Daniele viveu uma situação parecida, mas ela chegou a trancar a matrícula no sexto período, após desenvolver um quadro de depressão. A estudante veio sozinha para Vilhena estudar Jornalismo na UNIR. Mudou-se para a cidade na semana que saiu o resultado do processo seletivo, deixando familiares e amigos para trás. Nos primeiros meses, teve dificuldades em fazer amigos e, por isso, ficava a maior parte do tempo sozinha em seu quarto. Sem amigos ou incentivo, foi desistindo das matérias aos poucos, até que não conseguia mais sair de casa. “Chegou a um momento que eu não sabia mais o que eu estava fazendo aqui, eu tentava correr para todos os lados e eu via que estava sozinha”, explicou.
Os estudantes que mudam de cidade, tendem a sofrer mais com distúrbios emocionais, principalmente por causa da solidão e da sensação de desamparo. “Os estudantes precisam lidar com a vida adulta muito cedo, cuidar da casa, trabalhar, fazer novos amigos, lidar com dificuldades da vida adulta que antes eram feitas por seus pais”, enfatizou Naconechny.
Para Lívia, o curso de Letras da UNIR busca a perfeição em seus alunos, com as melhores notas dentre os departamentos, maiores participações em grupos de extensões e pesquisas. Os professores estimulam a competição entre os estudantes, segundo a Lívia. Já Vitória e Daniele destacam que as atividades práticas do jornalismo são, em muitos momentos, desgastantes. Vitória confessa que é nesse momento que tem medo de não atingir o seu melhor e decepcionar seus pais, familiares e professores.
Mesmo com problemas e enfrentamentos, as três estudantes revelam que desejam continuar com o curso e obter da universidade o melhor aprendizado possível. Lívia é bolsista do Programa Institucional de Bolsas e Trabalho Voluntário Iniciação Científica (PIBIC) da UNIR e conta que participar do projeto científico é um sonho e uma realização pessoal.
ROTINA ACADÊMICA SAUDÁVEL
Os estudantes universitários buscam cada vez mais acompanhamento psicológico por conta desses distúrbios emocionais adquiridos durante a graduação. Desde muito cedo, os estudantes são ensinados a competir, como forma de preparo para o mercado de trabalho. O objetivo é conquistar uma vida estável com segurança financeira, ótimo emprego, casa própria e carro do ano. Essa fase de transição e a rotina acadêmica intensificam as crises psicológicas na graduação.
Segundo a psicóloga Daniele Naconechny, a fase de transição entre a adolescência e a vida adulta é o momento quando suas habilidades profissionais e pessoais são testadas. Esse processo pode ser conturbado, quando não se consegue lidar com as situações de muita responsabilidade. “São jovens que até o momento estavam sendo superprotegidos e, quando entram nessa fase adulta, ainda não estão amadurecidos suficientes para receberem um não como resposta, ou críticas negativas”, revelou. A expectativa e a insegurança sobre futuro também levam o jovem a desenvolver problemas emocionais, pois é neste momento que estão vulneráveis.
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A estudante do 7º período de Letras, Mariana Aikanã, de 21 anos, está quase concluindo a graduação e assegura que a pressão só aumentou com o passar dos anos. “A pressão é muito maior do que quando entrei na UNIR. Primeiro porque resta apenas um período para concluir o curso; segundo, porque se espera que você já tenha desenvolvido o seu trabalho de conclusão de curso, ou pelo menos uma parte; e terceiro porque muitas pessoas perguntam o que faremos quando terminarmos o curso. Essas cobranças nos deixam ansiosos e até prejudicam o rendimento acadêmico”, contou.
A fisioterapeuta Paula Biason explicou que os cuidados com o corpo são importantes para que os estudantes consigam lidar com as dificuldades. “É preciso ter, uma boa alimentação, e fazendo fazer exercícios diariamente, dormir oito horas de sono por dia, fazer pausas para descanso, durante as atividades acadêmicas. Quando estamos com problemas, o corpo também reage de forma negativa, através do esgotamento psicológico”, revelou.
Para a psicóloga Daniele Naconechny, entender os próprios limites e ter organização são os primeiros passos para qualquer decisão. A profissional acredita que as universidades e as escolas poderiam ofertar uma disciplina de “inteligência emocional” para auxiliar os estudantes. “O desenvolvimento da inteligência emocional gera auto-gestão, consciência social e maior probabilidade de você alcançar suas metas de vida. Hoje em dia, o que eu percebo são pessoas com dificuldades de reconhecer o que sentem e, diante disso, reagem de uma forma que lhe traz consequências depois”, explicou.
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